Adhemar Ferreira da Silva- Um salto para a história
- Torcedor Cultural
- 15 de out. de 2019
- 3 min de leitura
Da Casa Verde para a glória do esporte olímpico
O Torcedor Cultural passa a apresentar matérias destacando os grandes atletas olímpicos da história até os Jogos 2020
Por Vilmar Vale
O Homem
Quando, em 29 de setembro de 1927, a cozinheira Augusta Nóbrega da Silva
deu à luz o seu primeiro e único filho, no bairro da Casa Verde, em São Paulo,
e seu marido, o ferroviário Antônio Ferreira da Silva, não imaginavam que seu
filho se tornaria um dos maiores nomes do esporte brasileiro e mundial.
O menino cresceu magro, de pernas finas, mas esperto e arisco arriscava seus
dribles como meio-campista do Grêmio Esportivo Centenário, sempre que
sobrava tempo entre o estudo e pequenos serviços para ajudar no custeio da
família. Crescendo, logo entendeu a necessidade de trabalhar e estudar para
superar sua origem humilde e gerar seu próprio sustento. Dessa maneira,
percebeu que seu futuro poderia estar no esporte. Não exatamente no futebol,
mas sim no Atletismo.
O Atleta

O destino conspirou para esse enredo no dia em que, por acaso, revendo um
amigo de infância, soube que ele havia se tornado um atleta. Fascinado pelo
som daquela palavra, quis saber mais e decidiu que também queria ser um
“atleta”. Para isso, muito contribuiu o técnico Dietrich Guerner que logo
percebeu o diamante bruto que tinha em mãos. Tanto, que nesse mesmo ano
de 1947, competindo oficialmente pela primeira vez, vestindo a camisa do São
Paulo, já vencia o Troféu Brasil saltando 13,05 metros. No ano seguinte, já
campeão paulista e detentor do recorde brasileiro do salto triplo, precisava
saltar 14,8 na mesma competição, para alcançar o índice olímpico e ir para os
Jogos de Londres. Saltou 15,03 e garantiu sua ida a primeira Olimpíada. Mas
sua performance não foi a esperada, muito pela inexperiência (pela primeira
vez competiu para um estádio com 100.000 pessoas) e pelo pouco tempo de
treinamento. Ficou em 14º lugar, com 29 competidores.
As Conquistas

A partir do ano de 1949, em razão da experiência adquirida e maior dedicação
aos treinos, suas marcas melhoram consideravelmente e ele salta 15,51
metros para estabelecer o novo recorde sul-americano. Em 1950, Adhemar
iguala o recorde (desde 1936) do atleta japonês Naoto Tajima saltando 16
metros.
Em 1951 conquista seu primeiro Pan-americano, em Buenos Aires. Chegamos
a 1952, ano dos Jogos Olímpicos de Helsinque (Finlândia), com Adhemar
Ferreira da Silva competindo no auge de sua forma e encantando a todos os
presentes no Estádio Olímpico de Helsinque. Naquele 23 de julho, nas seis
tentativas a que tinha direito na competição, ele quebrou seu próprio recorde
quatro vezes, alcançando, sucessivamente, 16,5m, 16,09m, 16,12m e 16,22m.
Com esse índice, Adhemar conquista a medalha de ouro olímpica para o Brasil,
superando o soviético Leonid Sherbakov e o venezuelano Arnoldo Devonish, e
estabelece o novo recorde mundial da modalidade, sob os aplausos da torcida
finlandesa que o adotou durante a competição. Nesse momento, ainda tomado
de emoção pela conquista, intuitivamente começa a correr pela pista do estádio
em agradecimento e, sem perceber, cria e eterniza o hábito da volta olímpica,
posteriormente adotado por outros campeões. Em 1955, nos Jogos Pan-
americanos do México, Adhemar recupera o recorde mundial (perdido para
Sherbacov, com 16,23m), saltando 16,56m e conquista o bicampeonato da
competição.
Em 1956 chegamos aos Jogos de Melbourne (Austrália). Mais experiente e
bem preparado, Adhemar, já atleta do Vasco da Gama, foi surpreendido por
uma forte dor de dente que quase o tira da Olimpíada. Resolvido esse
problema, restava encarar e vencer seus verdadeiros adversários: o soviético
Vitold Kreyer e o islandês Vilhjalmur Einarsson. E isso aconteceu no dia 27 de
novembro quando, com um salto de 16,35m, vence a disputa, torna-se
bicampeão olímpico e detentor do novo recorde olímpico. Chegava longe o
menino da Casa Verde, filho da D. Augusta e do Sr. Antonio. Em 1959, nos
Jogos Pan-americanos de Chicago, ele se tornaria o primeiro tricampeão na
modalidade, conquistando seu terceiro ouro consecutivo no salto triplo.
Adhemar Ferreira da Silva, além dos títulos acima, ainda foi cinco vezes
campeão sul-americano e dez vezes campeão brasileiro, caracterizando uma
carreira esportiva de muito merecimento e talento. Em 1960, com 33 anos, ele
ainda participa dos Jogos Olímpicos de Roma mas, debilitado por uma
tuberculose, não consegue classificação para a final da modalidade, sendo
15,07m seu melhor salto.
Um Exemplo
Adhemar, após encerrar sua carreira, colecionou outro tipo de título. Buscou
conhecimento e formação, acrescentando ao seu curso de escultor pela Escola
Técnica Federal de São Paulo (1948) graduações em Direito, Educação Física
e Relações Públicas. Devido a sua facilidade com idiomas exerceu a função de
adido cultural na Embaixada Brasileira, em Lagos, na Nigéria, entre 1964 e
1967.
Adhemar Ferreira da Silva ainda atuou como locutor, jornalista e ator,
falecendo em 12 de janeiro de 2001. Condecorado pelo COI e pela IAAF (“Hall
of Fame”), mais do que um atleta, um campeão olímpico ou um desportista de
talento, o exemplo que esse homem deixa é de muita persistência, fé em seu
potencial natural, coragem, trabalho, disciplina e uma crença absoluta nos
valores adquiridos na infância, nos tempos da Casa Verde, em família, que
sempre permearam e inspiraram sua vida.
Adhemar Ferreira da Silva ..... homem, atleta, campeão e exemplo.
Comments